Todos os que já ouviram falar sobre a Educação Clássica, provavelmente já ouviram falar no Trivium. Afinal de contas, o que é o Trivium?
Vamos começar pela etimologia da palavra. Trivium é uma palavra latina que significa "três vias". Que vias seriam essas? A Gramática, a Lógica e a Retórica. Juntas, elas compõem as três primeiras das Setes Artes Liberais que foi o currículo formativo de milhares de gerações por séculos e séculos, especialmente durante a antiguidade clássica e idade média, mas que foi [defendo: intencionalmente] ignorado pelos acadêmicos da pedagogia moderna.
O termo “Liberal”, no título que se dá a tais artes, vem do latim liber, que significa “livre”, no sentido de ter liberdade para escolher a instrução, para procurar a educação, sob a orientação de um mestre. Essa era a principal característica da educação liberal até o fim da Idade Média: a não obrigatoriedade da educação e o não enquadramento dela pelo poder estatal.
Dentro das Artes Liberais, o Trivium envolve o âmbito da linguagem na formação educacional, por meio dos estágios da gramática, lógica e retórica, que habilitam o aprendiz em suas fases de desenvolvimento ao conhecimento do mundo ao seu redor, ao raciocínio e à argumentação. Sem o bom desenvolvimento da Gramática, Lógica e Retórica, habilitando o aprendiz ao aperfeiçoamento das competências da linguagem, todo o restante do aprendizado ficará prejudicado.
É importante compreender que o Trivium pode ser aplicado de duas formas.
A primeira consiste no estudo formal das três vias que compõem o Trivium, ou seja, o estudo sistemático das matérias propriamente ditas da Gramática, da Lógica e da Retórica.
A Gramática sendo vista como a arte que ensina a maneira de escrever e falar corretamente. A Lógica como a arte que ensina o aluno a discernir o verdadeiro do falso. E a Retórica, a arte de falar bem e de se comunicar com sabedoria.
A segunda forma de aplicação do Trivium é enxergando-o como as etapas necessárias para o aprendizado de qualquer matéria ou assunto.
A fase da Gramática é o coração do Trivium e onde se inicia todo conhecimento. Esta é a etapa que se precisa aprender o vocabulário referente aquela área do conhecimento, e reter grandes quantidades de informações.
Cada área do conhecimento possui a sua gramática própria. Uma base sólida é estabelecida em cada matéria de estudo nesta fase.
Quando as crianças estão prontas a compreender os fundamentos do que está se propondo a conhecer, ensinamos lógica. O estudo da dialética (ou lógica), que permite os alunos aprenderem a raciocinar corretamente, e detectar e refutar raciocínios falsos.
A fase da retórica se inicia quando os alunos já foram bem treinados na arte de compreender e de raciocinar corretamente, e agora eles precisam ser treinados a se expressar com articulação, ensinar com clareza e produzir com eficiência.
Assim, depois que estudou e praticou a gramática, a lógica e a retórica, o aluno estará preparado para estudar qualquer tópico.
Vamos ao exemplo. Ao estudar matemática, eu preciso compreender (i) a Gramática da matemática ao conhecer os números e os conceitos matemáticos elementares, (ii) a Lógica da matemática que consiste na capacidade de relacionar os números por meio das operações, e a Retórica da matemática que significa desenvolver a capacidade de utilizar os conceitos e operações matemáticas para aplicar na resolução criativa de problemas da vida.
Uma coisa interessante de notar é que as vias da Gramática, Lógica e Retórica quando aplicadas como método de aprendizado, possuem uma forte conexão com as fases de desenvolvimento da criança. Por exemplo, uma criança de até 09 anos está mais habilitada a desenvolver os seus conhecimentos da Gramática das matérias em geral, entre 10 e 14 anos a ênfase deve ser tornar mais forte na Lógica, enquanto que a partir dos 15 anos podemos perceber aptidões para a Retórica, ou seja, a capacidade criativa e argumentativa mais aguçada do aprendiz.
Penso ser bastante útil e ilustrativo o que Dorothy Sayers fala sobre as três fases do Trivium em seu texto "As Ferramentas Perdidas da Aprendizagem":
"Estes, numa forma simples chamarei o ‘Papagaio’, o ‘Arrojado’ e o ‘Poético’ — este último coincidindo, aproximadamente, com a ocorrência da puberdade. O estágio ‘Papagaio’ é aquele no qual o aprendizado intuitivo é fácil e, como um todo, prazeroso; enquanto que o raciocínio é difícil e, como um todo, de pouco prazer. Nesta idade, a pessoa memoriza as formas e as aparências de coisas com facilidade; gosta de recitar os números das placas de carros; alegra-se com as rimas e os sons guturais de polissílabos ininteligíveis; gosta do simples acúmulo de coisas. A idade do estágio ‘Arrojado’, que se segue àquela (e, naturalmente, durante algum tempo mescla-se com ela), é caracterizada por contradizer, por responder, por gostar de “descobrir erros dos outros” (especialmente parentes mais velhos); e pelo gostar de propor charadas. Sua capacidade de incomodar é extremamente alta. Usualmente se aquieta mais durante o nível escolar secundário. A idade do estágio ‘Poético’ é conhecida popularmente como a idade “difícil”. Nela o indivíduo é introvertido, tem forte necessidade de expressar-se; de certa forma torna-se especialista em ser incompreendido; é incansável e tenta alcançar independência; e, com sorte e um bom direcionamento, deveria mostrar os começos de criatividade; um esticar-se ao encontro de uma síntese do que já sabe, e uma ânsia deliberada de conhecer e de fazer alguma coisa, em preferência a todas as demais."
Se o Trivium for encarado e aplicado consistentemente destas formas, produziremos, a médio e longo prazo, pessoas com a capacidade de estudar qualquer assunto e aprender sobre qualquer tema. Mas não só isso. Formaremos pessoas com a capacidade de produzir com eficiência e excelência, em qualquer área da vida… tudo para glória de Deus!
Texto escrito pelo Pr. Matheus Macedo
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